INTRODUÇÃO
A primeira biópsia hepática para fins diagnósticos foi realizada em 1923. Desde então, a técnica tem sido modificada e, graças à sua baixa morbidade e mortalidade, têm sido usada amplamente para diagnóstico na área de Hepatologia. A análise histológia é útil no diagnóstico de doenças como hemocromatose, hepatite autoimune, colangite esclerosante e cirrose biliar primária, podendo ser também utilizada no estadiamento e controle de tratamento das hepatites virais.
INDICAÇÕES
Como diagnóstico nos casos de:
- investigação de alterações de enzimas hepáticas onde os demais exames foram inconclusivos
- avaliação do estágio de fibrose em hepatites crônicas
- avaliação da hepatite autoimune
- avaliação de nódulo hepático onde os exames de imagem não foram conclusivos
- quantificar o ferro hepático na hemocromatose
- quantificar o cobre hepático na doença de Wilson
- avaliar a gravidade da doença hepática pelo álcool
- avaliação do fígado de doadores
- diagnóstico e estadiamento da doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA)
- avaliação de icterícia não explicada
- diagnóstico de doença colestática
- avaliação de doenças infiltrativas e granulomatosas
- avaliação da hepatite tóxico / medicamentosa
No seguimento nos casos de:
- hepatite C crônica em tratamento (geralmente não há mais essa indicação)
- monitoramento do tratamento da hepatite autoimune (pode ser necessária para decidir quando suspender a medicação imunossupressora)
No pós transplante hepático:
- diagnóstico de rejeição celular aguda
- diagnóstico de rejeição crônica
- diagnóstico de hepatite C recorrente
- diagnóstico de doença linfoproliferativa pós transplante
- diagnóstico da hepatite pelo citomegalovírus
- protocolos de seguimento de fibrose ou inflamação
CONTRA INDICAÇÕES
- paciente não cooperativo
-
dificuldade de encontrar local adequado de biópsia pela percussão ou ultrassom
- coagulopatia severa (RNI > 1,5 ou plaquetas < 60.000)
- discrasias sanguíneas (como hemofilia)
- uso de AAS ou anticoagulantes
- ausência de suporte cirúrgico ou hemoderivados em caso de complicações
- obesidade mórbida
- ascite
- cisto hidatido ou hemangioma cavernoso
- infecção na região
TÉCNICA
São descritas três técnicas, a saber, percutânea, transjugular e laparoscópica, sendo que as duas últimas são indicadas em pacientes com coagulopatia ou ascite, que não permitem a técnica percutânea. Em relação à esta, opto por realizar a biópsia pelas vias mais seguras, a transtorácica e a subcostal (em casos de hepatomegalia), guiada por ultra-som (permite acesso à uma faixa mais larga de parênquima hepático, reduz o risco de punção de órgãos adjacentes, especialmente em crianças, e melhora a escolha do local da punção).

Biópsia hepática percutânea
Biópsia hepática percutânea
Utilizo a seguinte técnica: os pacientes, em posição supina, são submetidos a venóclise periférica com administração lenta de soro glicosado a 5%. Após limpeza local e colocação de campo estéril, o paciente recebe anestesia local com lidocaína com epinefrina 1:20.000 guiada por ultra-som. A biópsia é realizada com agulha trucut 16G (que combina a vantagem de baixo risco pelo menor calibre e no entanto fornece material adequado ao exame histopatológico), também guiada. Após o procedimento, são observados clinicamente, sendo aferidos pulso e pressão arterial de 15 em 15 minutos nas primeiras 2 horas e de 30 em 30 minutos nas 4 horas seguintes. Ao final da observação (no mínimo 6 horas), são submetidos a novo exame ultra-sonográfico a fim de detectar líquido livre na cavidade abdominal. O paciente somente é dispensado se não apresentar instabilidade hemodinâmica, líquido livre abdominal ou outras complicações.
Vídeo sobre o procedimento (em inglês)
Dependendo dos protocolos do serviço realizado, pode ser administrada sedação prévia ao procedimento, com benzodiazepínico por via oral, ou a sedação logo antes do procedimento (com benzodiazepínico e/ou fentanila). A analgesia sistêmica (geralmente com peptidina) também pode ser realizada logo antes, durante o procedimento e/ou após se houver dor. Cada uma dessas opções está relacionada a vantagens e desvantagens técnicas e de conforto.
SEGURANÇA
A biópsia hepática percutânea é um procedimento seguro, sendo descrita uma taxa de mortalidade variando entre 0,1 e 0,01%, incluindo pacientes com neoplasias e insuficiência hepatocítica com distúrbios da coagulação. De fato, a principal causa de mortalidade relacionada ao procedimento é a hemorragia, que se apresenta clinicamente nas primeiras 6 horas após a biópsia (mas há estudo sugerindo que a hemorragia precoce ocorreria na primeira hora e que a alta seria segura após 1 hora). A dor é frequente, mas geralmente bem tolerada e localiza-se principalmente no local da punção e no ombro direito. A morbidade é baixa, sendo a mais comum dor intensa (1,5 a 3,0%), hemorragias subclínicas (0,35-1,6%) e punção de órgãos adjacentes (0,01 a 0,1%). São considerados como fatores de risco no procedimento a experiência do médico, a técnica utilizada (preferencialmente guiada por ultra-som) e o número de passagens (ou tentativas).

Como é a amostra retirada do fígado
A biópsia hepática percutânea guiada por ultra-som é portanto segura em pacientes selecionados, ou seja, excluídos aqueles com condições que aumentem o risco de hemorragia (6 a 10 vezes), a saber, encefalopatia, ascite, insuficiência hepatocítica com icterícia severa e evidência de obstrução biliar extra-hepática, coagulopatia significativa, doenças graves em outros órgãos (como insuficiência cardíaca congestiva) ou idade avançada. A equipe de biópsia hepática do Dr. Ademar Yamanaka no Gastrocentro-Unicamp já tem experiência em mais de 500 pacientes que foram submetidos a biópsia nestas condições e foram para casa no mesmo dia, sem internação, com 0% (zero) de complicações.
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Artigo criado em: 2003
Última revisão: 11/10/18