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Encefalopatia hepática pode ser responsável por parte dos casos de demência

Demência é uma das maiores preocupações à medida que envelhecemos ou convivemos com pessoas que estão chegando ou ultrapassando a idade de 60 a 65 anos. Ela surge gradualmente, atingindo memória, raciocínio e fala, podendo se agravar à ponto de prejudicar seriamente a qualidade de vida e a capacidade de se cuidar. Esse é um problema grave que atinge cerca de 2 milhões de brasileiros, número que pode triplicar até 2050.

Há várias causas de demência, algumas relacionadas aos vasos sanguíneos do cérebro (relacionadas a hipertensão, diabetes, etc.) e outras doenças que atingem diretamente os neurônios. De modo geral, infelizmente, há pouco o que se possa fazer em relação à doença neurológica em si, com medicamentos que apresentam resultados variados ou que se limitam a tratar as consequências.

O que geralmente não se leva em consideração é que a encefalopatia hepática (EH), uma complicação da cirrose, pode ser muito semelhante à demência. A EH não está relacionado aos vasos ou a lesão nos neurônios em si (embora cause lesão se não tratada adequadamente) – ela é causada pela incapacidade do fígado de retirar toxinas (especialmente amônia) do organismo. Clinicamente, ela pode ser indistinguível da demência por outras causas e não aparece nos exames de imagem no cérebro. Se não houver outros sinais de cirrose, ou se o médico não suspeitar dessa possibilidade, ela pode passar despercebida e não ser tratada !

É comum esquecemos de considerar a possibilidade de doença do fígado no portador de doença neurológica, a não ser que seja uma situação óbvia, como no alcoólatra ou com sinais evidentes de cirrose. Mas a cirrose tem muitas causas sem relação com o álcool e que aumentam com a idade, como a colangite biliar primária e a hepatite autoimune, além das hepatites B e C. E exames de rotina como o ultrassom podem não detectar a doença.

Essa suspeita foi o que levou os pesquisadores Jasmohan S. Bajaj e colegas da Universidade Virginia Commonwealth University e do Richmond VA Medical Center a levantar dados de veteranos com diagnóstico de demência (mas não de cirrose) e, utilizando exames laboratoriais, descobriram que 5 a 10% dessas pessoas tinham alto risco de fibrose avançada do fígado ou de cirrose. Os achados foram publicados na revista Clinical Gastroenterology and Hepatology.

O estudo utilizou o escore FIB-4, onde leva-se em consideração idade, AST, ALT e quantidade de plaquetas. Para não superestimar o resultado pela idade, todos os pacientes com idade acima de 65 foi usado 65 fixo. Mesmo assim, 10,3% dos veteranos tiveram escore > 2,67 (indicando fibrose avançada) e 5,3% > 3,25 (sugestivo de cirrose).

Para confirmar os achados, os pesquisadores avaliaram veteranos com diagnóstico de demência a partir daí e aplicaram o FIB-4, obtendo os mesmos resultados. Estudando esses pacientes mais a fundo, apenas 5% tinham outras causas para o escore alto não relacionadas a cirrose. Os outros 95% ou tiveram diagnóstico de cirrose, ou estavam com risco para a doença ou não tiveram diagnóstico da causa do escore alto.

O que aprendemos com essa pesquisa é que todo paciente com diagnóstico de demência deve realizar exames para avaliar o fígado, nem que seja apenas um escore simples como o FIB-4. O diagnóstico de encefalopatia hepática permite muitas vezes o tratamento e a recuperação da autonomia e da qualidade de vida, sem falar no fato de que o diagnóstico de uma doença grave como a cirrose permite o tratamento da mesma (como nos casos de cirrose por hepatites B ou C) com mudança na evolução e o rastreamento de outras complicações da doença do fígado.

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