
A pandemia pelo COVID-19 já terminou, mas as consequências ainda estão sendo contabilizadas. Já foram publicados muitos artigos sobre as consequências diretas do vírus sobre o fígado, que levou a quadros de hepatite e a colangites rapidamente progressivas, por exemplo.
Agora vem as contas da mudança dos estilos de vida durante a pandemia. Observamos aumento global no peso, diabetes, dislipidemia e hipertensão, aumentando os casos de esteatose associadas a síndrome metabólica. Mas as consequências da esteatose são lentas, e podem ser revertidas com mais facilidade.
A pandemia veio acompanhada de medo, ansiedade, depressão e, porque não dizer, um aumento considerável de tempo livre e ócio, que geraram um consumo exagerado de álcool em todo o mundo, especialmente de destilados.
Ao contrário da doença metabólica, o abuso de álcool, relatado em todo o mundo, trouxe consequências mais rápidas: o CDC norte americano recentemente relatou que as mortes relacionadas pelo álcool cresceram de forma assustadora com a pandemia, especialmente as mortes por doenças hepáticas. Essas cresceram em 30% durante o primeiro ano da pandemia, e no ano passado cresceram 25% na Califórnia, onde matou durante a pandemia mais gente que os acidentes de trânsito e o câncer de mama !

Esses achados são consistentes com os de outros países. No Reino Unido, as mortes por doenças hepáticas pelo álcool cresceram em 21% durante a pandemia. No Brasil, sabemos que o consumo de álcool aumentou em 17,2% das pessoas, o que deve ter levado a resultado semelhante.
As doenças hepáticas pelo álcool englobam principalmente a hepatite alcoólica e a cirrose, com todas as suas complicações, incluindo o câncer do fígado. Elas se tornaram tão importantes no Brasil, que o CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool) observou que a maioria das mortes causadas pelo álcool no Brasil hoje é causada por hepatopatias alcoólicas (18,5%), ultrapassando os acidentes de trânsito (16,4%) e outras complicações do álcool.
Cabe mencionar que as doenças hepáticas do álcool são causadas pelo consumo abusivo de álcool, que é uma situação muito diferente do alcoolismo. Enquanto o alcoólatra depende do álcool, o abuso pode ocorrer sem qualquer dependência, incluindo aí consumo nos finais de semana. Para desenvolver doença, não importa a dependência, e sim a quantidade de álcool, e as mulheres são mais vulneráveis. Considera-se que o consumo de mais de 30g de álcool por dia por homens e 20g por mulheres está relacionado a risco aumentado de desenvolver doença hepática pelo álcool, mas essa quantidade pode variar dependendo de diversas situações, incluindo grandes quantidades de álcool de uma só vez.

Enquanto esperamos que o consumo de álcool diminua após a pandemia, logo teremos estatísticas relacionadas à terceira onda de complicações hepáticas pela pandemia, incluindo diagnósticos atrasados, perda de acompanhamento médico, falha nos rastreamentos de hepatocarcinoma e de tratamentos de hepatites B e C.
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